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O MODELO DAS FESTAS EM MEADOS DO SÉC. XX

por Francisco Galego, em 20.08.15

A "FESTA" NOS ANOS 50

 

1953 - A TENTATIVA DE REGRESSO À ANUALIDADE DAS "FESTAS"

 

Mais uma vez, a intenção da anualidade das festas, aqui fica testemunhada. As festas realizaram-se no ano seguinte, procurando manter o que se julgava ser a tradição praticável mas que, devido a acontecimentos vários, era constantemente interrompida.

As Festas de 1953 atingiram um brilho inesperado, trazendo à memória dos mais velhos as saudosas Festas Grandes de 1927. É que, tal como estas, as "Festas" do princípio dos anos cinquenta, deixam de ser promovidas por instituições e passam de novo a ser organizadas por uma comissão constituída por artífices, como tinham sido até aos finais dos anos vinte.

 

LINHAS DE ELVAS, nº 152, 29 de Agosto de 1953

Festas do Povo em Campo Maior

   Começam no dia 6 e estendem-se até 9 de Setembro, as tradicionais Festas do Povo na vizinha e acolhedora vila de Campo Maior.

   Os quatro dias de festa são preenchidos com atraentes números de que destacaremos: solenidades religiosas em honra de S. João Baptista com procissão, concertos pelas bandas municipais de Campo Maior e 1º de Dezembro de Elvas, quatro corridas de touros à vara larga, arraiais com fogo preso e do ar, bailes, largada de balões e um atraente espectáculo de variedades no dia 6, com os artistas Fernanda Peres, Francisco José, Margarida Amaral, Mimi Muñoz, Noémia Feijó, Eduardo Futre e outros.

   Além destes belos números, teremos ainda o belo espectáculo da ornamentação de todas as ruas pelos seus moradores.

 

LINHAS DE ELVAS, nº 154, 12 de Setembro de 1953

Notícias de Campo Maior – As tradicionais Festas do Povo

   Como tinha sido anunciado, realizaram-se nesta leal e valorosa vila de Campo Maior, nos dias 6, 7, 8 e 9 de Setembro, as populares Festas dos Artistas, este ano a favor da Cantina Escolar e Santa Casa da Misericórdia.

   As ruas vistosas e artisticamente arranjadas, diferentes todas, apresentavam-se bonitas, garridas e mereceram dos milhares de pessoas que as visitaram os mais rasgados e merecidos elogios.

   Efectivamente, é de louvar este esforço colectivo de um povo artista, capaz de realizações desta natureza e levadas a cabo, note-se bem, a expensas particulares.

   Merecia Campo Maior das entidades oficiais protecção eficaz, propaganda verdadeira, tanto mais que estas festas são de acentuado cunho popular. Este espectáculo das ruas floridas é único em todo o país e devia ser conhecido de todos os portugueses. Para tanto, é necessário, propaganda em todos os sentidos, bairrismo extreme, programas mais variados e tudo o mais que se puder fazer, para que ao visitante se proporcionem umas festas de sonho.

   No programa das festas estiveram incluídos os seguintes números a que assistiram imensas pessoas: alvoradas e concertos pelas bandas de Campo Maior e Elvas; festividades religiosas em honra de S. João, padroeiro da vila; bailes populares; vistoso fogo de artifício e ainda um magnífico espectáculo de variedades, conseguido por Guilherme Ruiz e apresentado na Praça da República, também decorada e ornamentada a primor.

   O vasto e alegre recinto recebeu uma multidão numerosa que foi assistir ao grandioso festival e no qual actuaram os categorizados artistas: Luís Piçarra, Fernanda Peres, Margarida Amaral, Gina Maria, Eduardo Futre, os bailarinos excêntricos Geny e Bel Guerra; Casimiro Ramos e Castro Mota. A locução esteve a cargo de Mimi e Hernâni Muñoz, tendo Guilherme Ruiz, da Comissão das Festas, proferido antes do espectáculo, um caloroso discurso em que evocou as origens remotas das Festas dos Artistas, explicou a sua projecção no campo popular e beneficente e terminou, com muito aplausos, exortando o povo de Campo Maior para que continue a tradição, apresentado estas maravilhas de cor e beleza que são as ruas de Campo Maior, no Alto Alentejo, nestes primeiros dias de Setembro.

   O trabalho dos artistas agradou completamente (excepção feita à orquestra Odeon) não lhe regateando o público fortes aplausos, não obstante a desagradável espera de uma hora que todos sofreram pelo começo do espectáculo.

Não há efeito sem causa…

(…) No que se refere à propaganda das festas, lacuna por demais evidente e clamorosa, é de lamentar que nunca se tivessem convidado os representantes da imprensa a assistirem a algumas das reuniões – e elas foram tantas! – que lhes fornecessem os elementos que os habilitassem a cumprir a sua missão.

   - Missão estimável e que não trazia quaisquer encargos para a organização.

   Tal comportamento trouxe, como era natural, o alheamento compreensível dos representantes dos jornais.

   Além do mais, a sua presença estimularia os organizadores dos festejos, posto que podiam sentir-se amparados por uma colaboração desinteressada e útil…

   Que o programa não este à altura do esforço admirável do povo que ornamentou e transformou em fantástica visão de sonho e beleza as ruas da vila? Não restam dúvidas a ninguém. Nós fomos os primeiros a lamentá-lo. Mas, concluir-se daí e empiricamente que poderia haver o propósito de colocar mal a nossa terra, é atitude que não corroboramos por nos parecer um excesso que a paixão ditou.

   À primeira vista e no auge da paixão, assim parece. Mas, serena e objectivamente, nenhum de nós aceita que assim tenha sido e nem mesmo aqueles que assim pensaram, o aceitam hoje.(…)

   Todavia, a crítica tem de fazer-se e não podemos deixar de referir que é realmente desolador obrigar uma banda que nos visita a efectuar os seu concertos na “cave” – como graciosamente lhe chamaram – do nosso formoso Parque que, diga-se de passagem, exibia feérica iluminação fúnebre; como foi igualmente desoladora a pobreza dos números festivos e, mesmo assim, não cumpridos integralmente.

   Quatro corridas de touros à alentejana e um balão que não subiu, é pouco para festas de tão elevado cunho tradicional e que tanto esforço demandam por parte do povo que lhes dá vida, calor e os encantos duma esplendorosa intuição artística!

   Excluído o excelente espectáculo dos artistas da rádio – que não pode dispensar-se em nossos dias, mas que é incaracterístico por não ter qualquer cunho regionalista – o programa das festas foi, praticamente, inexistente.

   É verdade. Mas acreditamos e, sinceramente o afirmamos, que a Comissão das Festas sentiu como nós a angústia e a tristeza dos comentários e exclamações de muitos forasteiros: “Isto é muito lindo!”… “As ruas são um encanto!”… “Isto é único!”… Mas “além disto o que há mais?!”…

   E, então, voltamos ao princípio: não há efeito sem causa e a Comissão das Festas pode ter sido o efeito de uma causa a que não soube estar atenta…

   E como eles, tal qual nós, são amigos da nossa terra é que quisemos apontar-lhes as falhas, não para os condenar unilateralmente, mas para que apontando os deslizes – que nós próprios podíamos cometer em idênticas circunstâncias – possamos contribuir para uma melhor actuação no próximo ano.

   Estas Festas do Povo de Campo Maior podem e devem constituir o nosso melhor cartaz; mas só em boa e leal colaboração poderemos levar o grito álacre desse cartaz através de todos os recantos de Portugal.

   E a crítica construtiva, serena, calma e objectiva é, em nosso entender, o primeiro passo para tão bela jornada.

   Por nossa parte assim o pensamos.

                                                              Marciano Ribeiro Cipriano

 

    1. Nas  Festas, sempre se tinha realizado a Procissão com a Imagem do padroeiro São João Baptista, que percorrerá as principais ruas da vila. No segundo dia, segundo o Programa de 1952, ou no primeiro dia, segundo o Programa de 1953. Mas, nas Festas de 1957, no programa consta, para o primeiro dia, às 10 horas, uma Procissão com a imagem de São João Baptista para a Igreja Matriz, seguida de missa solene e sermão, às 11 horas; às 18,30 horas Grandiosa Procissão com as Imagens dos Padroeiros de Campo Maior, pelas ruas principais desta Vila deslumbrantemente ornamentadas e, às 20 horas, Regresso da Procissão à Igreja de São João Baptista e Bênção Solene do SS. Sacramento, executando o coro e a orquestra cânticos religiosos.

            Repare-se que no ano de 1957 se referem os padroeiros logo, Nª Sr.ª da Expectação e São João Baptista, enquanto que nos anteriores anos de 1952 e 1953, havia apenas referência ao Santo Padroeiro São João Baptista. No entanto, já anteriormente, nos programas das Festas de 1941 e 1944, os programas referiam Procissão com as imagens dos padroeiros das freguesias de Nossa Senhora da Expectação e São João Baptista…

 

             2. As Festas, neste ano de 1957, deram um salto qualitativo no que respeita aos espectáculos programados: as corridas de touros deixaram de se realizar segundo o modelo tradicional à vara larga, dando lugar a espectáculos tauromáquicos com toureiros, forcados e cavaleiros profissionais. Antes e durante as Festas, começava a cuidar-se de organizar diversões que atraíssem os forasteiros, publicitando-as ao mesmo tempo que se recolhiam receitas para a sua realização. Nota-se que a dimensão das Festas crescia de tal modo que, a maneira tradicional de recolher fundos com peditório entre a população, já não era suficiente para fazer frente aos pesados encargos que estas comportavam.

           

            Tudo isto indicia as grandes mudanças socioeconómicas que se estavam a operar na comunidade campomaiorense. A pujança alcançada pelas Festas pode ser explicada por estas transformações. Talvez devamos ainda juntar-lhe uma outra mudança sociológica, já antes referida e que se iria acentuar a partir dos finais dos anos cinquenta: a saída massiva de gente para os grandes centros urbanos, principalmente para a cintura industrial da Grande Lisboa e a emigração para os países em processo rápido de crescimento económico. Essas tendências que tanto se iriam acentuar ao longo dos anos sessenta, marcaram profundamente a vida em Campo Maior.

            Podemos justamente considerar 1957 como o ponto de partida e o momento de viragem, de toda essa importante e significativa transformação. Porém, novos e importantes acontecimentos iriam determinar um novo período de interrupção. Desta vez , as Festas, ficaram por mais seis anos sem realização.

 

               3. No decurso dos anos cinquenta, Portugal conheceu uma importante transformação. Chegava ao fim a ideia de um Portugal país essencialmente agrícola e, com os planos de fomento, o país lançava-se numa política de desenvolvimento industrial que provocou a deslocação de grandes massas de população para as cinturas industriais de Lisboa e do Porto.

            Em 1951, morreu o presidente Carmona, tendo-lhe sucedido na chefia do Estado, o General Craveiro Lopes. Os tempos de unidade dentro da orgânica do Estado Novo tinham terminado, pois as relações de Salazar com o novo Presidente da República, conheceram vários momentos de grande atrito.

            Em 1958, o regime foi submetido a uma dura prova com a candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República. Só à custa de uma acirrada resistência, recorrendo a todos os processos para garantir a sobrevivência política, Salazar conseguiu manter o controlo da situação, fazendo eleger o Almirante Américo Tomás como presidente.

            Mas, logo outra tempestade política se levantou com o movimento de descolonização posto em marcha por todo o Mundo. Em 1961, começou a contestação aberta em todas as parcelas do Império Português. A guerra colonial então desencadeada, causou profundas mudanças nas estruturas sociais, económicas e políticas do país.

            Assim, na viragem para os anos sessenta, começou o processo de transformações que iriam ditar o fim do salazarismo. Portugal, regularmente censurado pelas suas políticas em todas as instâncias internacionais, estava cada vez mais condenado ao isolamento. A proclamação do orgulhosamente sós de Salazar, era mais um grito de desespero de causa do que a afirmação da força de uma convicção.

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