Numa entrevista à televisão o primeiro-ministro anunciou o alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos
Há países desenvolvidos que têm, expressos na lei como obrigatórios, apenas 9 anos de escolaridade: a Itália, Áustria e a Suíça, por exemplo. Esta situação só aparentemente poderá surpreender, pois que, se as leis se destinam a determinar o que, por interesse ou necessidade pública, deve ser feito ou reprimido, para quê cuidar de regulamentar o que, por si mesmo, funciona na perfeição? Se um país, devido ao elevado desenvolvimento económico e cultural da sua população, já pratica uma escolaridade suficientemente prolongada, que necessidade há de se fazerem leis a imporem o seu prolongamento?
Mais difícil de entender será o caso de países pouco desenvolvidos que têm, nas leis expressa uma obrigatoriedade de 11 ou 12 anos de escolaridade, sendo visível o seu baixo nível de desenvolvimento, como a Moldávia, a Arménia, os Barbados, as Bahamas, o Togo, o Butão, a Guatemala e alguns mais. O que de facto acontece é que a lei expressa a necessidade de mudança, mas a sua concretização é algo muito diferente.
Em Portugal, neste campo, temos enfermado de um certo voluntarismo reformista que nos tem tornado rápidos a legislar mas muito lentos a executar. Decretámos muito cedo a escolaridade obrigatória: logo na 1ª metade do século XIX. Mas arrastámos elevados níveis de absentismo, de abandono e de insucesso escolar quase até à actualidade, estando ainda estes problemas por resolver completamente. De facto, só tornámos a escolaridade efectivamente obrigatória, após o 25 de Abril.
Nos finais da década de 80 do século XX, foi instituída uma escolaridade obrigatória de nove anos que foi muito deficientemente executada, com níveis preocupantes de insucesso e de abandono escolar. Porquê? Pela situação deficitária da educação ao longo de várias décadas. O país sofreu de falta de recursos materiais (escolas e equipamentos), de recursos técnicos (didácticos e de apoio à aprendizagem) e de recursos humanos (professores, especialistas e pessoal de apoio à educação), sendo que, muitos destes, ou não tinham formação adequada, ou eram pouco ou mal preparados. Só ultimamente temos assistido a esforços empenhados para suprir essas deficiências.
A situação foi-se arrastando porque também não havia grande pressão da população para que se efectuassem melhorias na educação devido à fragilidade económica e às carências culturais muito acentuadas das famílias. Por outro lado, a falta de sequência dos projectos políticos sobre a educação tem originado que, em vez de um processo contínuo e coerente, se tem caminhado por saltos, tendo uns como objectivo o desenvolvimento e outros a regressão. Referindo tempos mais recuados, veja-se a diferença entre as reformas educativas preconizadas pelo liberalismo no século XIX e pela 1ª República nas duas primeiras décadas do século XX, quando se chegou a planear o alargamento da escolaridade obrigatória para seis anos, com a radical redução, no tempo do Estado Novo, para apenas três anos de escolaridade obrigatória e, mesmo essa com total desleixo em relação ao insucesso e o abandono precoce da escola.
Outros países conseguiram a plena alfabetização na viragem do século XIX para o século XX. Nós, só nos aproximámos dessa meta na segunda metade do século XX. Estarão aí algumas das mais importantes causas do nosso tardio desenvolvimento em quase todos os domínios e dos atrasos estruturais que, ainda hoje, afectam a sociedade portuguesa.