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CANTIGAS A CAMPO MAIOR ( II )

por Francisco Galego, em 31.12.12

Antes, no duro trabalho dos campos, os camponeses expressavam o seu desespero e a dureza da sua vida, usando muitas vezes a ironia para disfarçarem a revolta pelas condições do seu modo de viver. Mas cantavam também o amor, namorando enquanto "balhavam", nos bailes dos domingos, dos dias santos, nas festas e nas romarias.

Agora, as condições tinham mudado radicalmente as suas vidas. Lá de longe, as cantigas antigas que vinham à mente eram as que falavam da terra que ficara tão distante. E outras novas, carregadas de saudade, eram inventadas.

 

 

Vila de Campo Maior,

Bela vila amuralhada;

Nela está meu pensamento,

Nela vive a minha amada.[1]

                                                       

Ó belo Campo Maior,

Terra de moças morenas,

Uma delas são ingratas,

Outras delas são tiranas.[2]

 

 

Campo Maior é sol-posto,

Barbacena é lua cheia,

Oh! Bela cidade d’Elvas,

Onde o meu amor passeia.[3]

 

Oh! Belo Campo Maior,

Bem podias ter colégio,

A água da Fonte Nova,

Tem fama no Alentejo.

 

Se queres sentir alegria,

Chega-te a Campo Maior;

Lindas fontes d’água fria,

Caras mais lindas que o sol.[4]

                                                       

Ó belo Campo Maior,

Terra de moças formosas,

És ainda mais bonito,

Cheio de cravos e rosas.

 

Ó belo Campo Maior,

Fronteira com Badajoz;

Ó terra maravilhosa,

Orgulho de todos nós.



[1] Publicada em A Sentinella da Fronteira, nº 154, Elvas, 21 de Setembro de 1882.

[2] Idem, nº 231,  Elvas,17 de Junho de 1883.

[3] Idem, nº 166, Elvas, 2 de Novembro de 1882. Repare-se que, esta cantiga e as assinaladas nas notas 1 e 2 constituem excepção, pois que, pelo tema, são mais propriamente cantigas de bem-querer, do que cantigas de saudade por Campo Maior. Todas as outras cantigas deste tema, são de construção bem mais recente, ou seja, da 2ª metade do século XX.

[4] Idem, nº 345, Elvas, 6 de Novembro de 1884, segundo recolha de A. T. Pires, com algumas diferenças.

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publicado às 18:53


UM RECOMEÇO... CANTIGAS A CAMPO MAIOR ( I )

por Francisco Galego, em 24.12.12

As minhas desculpas pelo interregno. Mas certas tarefas deixam marcas. Por outro lado, às vezes o melhor é parar para retomar folgo.

Enfim... cá estamos de novo para continuar. e vamos retomar com AS SAIAS, a maior e mais antiga expressão cultural dos campomaiorenses que luta hoje com muita dificuldade para não cair em total esquecimento e que tão mal tratadas são, de facto, hoje.

Tratemos pois de as divulgar tal como elas foram no seu tempo de apogeu.

 

Devido à mecanização da agricultura e ao surto industrial nas grandes cidades do litoral, a partir de inícios dos anos cinquenta do século passado, verificou-se um êxodo massivo das populações rurais para os grandes centros urbanos.

O desemprego frequente dos que se ocupavam nos trabalhos agrícolas que sempre fora uma das causas da constante situação de miséria dos assalariados agrícolas – sempre dependentes das condições do clima e do carácter sazonal do trabalho nos campos – tornou-se uma realidade dramaticamente presente, a partir da mecanização da agricultura, afectando não apenas os assalariados mas também os pequenos e médios agricultores. Estes, não tendo capacidade para adquirirem equipamentos de custos elevados, viram-se coagidos a vender as suas terras aos grandes proprietários.

Para toda esta gente, excluída da actividade agrícola, restava a debandada para as cidades.

Este êxodo foi logo seguido, nos anos sessenta, pela sangria demográfica que levou boa parte da população de Campo Maior a emigrar para os países da Europa central. Basta pensarmos no impacto destes fenómenos sobre o modo de vida de uma pequena comunidade, como era nesse tempo Campo Maior, para entendermos as modificações que, naturalmente, teriam de ocorrer.

A nível do “cantar as saias” verificou-se o rareamento das quadras que se cantavam enquanto se cultivavam os campos. Em contrapartida, verificou-se um significativo aumento de quadras de temática bairrista, muito ao gosto e ao encontro dos sentimentos saudosistas dos que estavam afastados da terra que os vira nascer.

Assim, lá longe, onde se vivia, a terra que, por força das voltas que a vida dá, se tivera que deixar, passava a ser imaginada com os encantos que lhe eram acrescentados por uma sofrida saudade.

Cantavam-se assim, de longe, os encantos da vila: 

 

Campo Maior terra linda,

Com’outra não há igual;

Esta terra é a rainha,

Na raia de Portugal.

 

Campo Maior tão velhinho,

Às portas tens um brasão;

Tu recebes com carinho,

A todos sem distinção.

 

Ó belo Campo Maior,

Com muralhas à francesa,

Cada vez canto melhor,

Cantigas à camponesa.[1]

 

Ó belo Campo Maior,

Meu cantinho alentejano;

És no nosso Portugal,

A terra que eu mais amo.

 

Ó belo Campo Maior,

Numa colina pousada;

Com terras de Espanha à vista

Pelos ‘spanhóis cobiçada.

 

Ó belo Campo Maior,

Terra de contrabandistas;

De gente boa e leal,

E das “festas dos artistas”.

 



[1] Publicada em Achegas para o Cancioneiro Popular Corográfico do Alto Alentejo, por J.A. Pombinho Júnior, 1957, pág. 56, com algumas diferenças.

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publicado às 18:27


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