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O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXIX

por Francisco Galego, em 27.05.11

OS ANOS 40 (III)

 

Nos dois anos seguintes as Festas não se realizaram. Lá fora, a guerra não parava de se agravar, envolvendo cada vez mais países e expandindo as acções de combate a todas as regiões do mundo, a todos os mares e a todos os oceanos. Até ao verão de 1942, o exército alemão dominava a Europa, o Próximo e o Médio Oriente e o Norte de África. Mas, em Dezembro de 1941, os japoneses atacaram Pearl Harbor, arrastando os Estados Unidos da América para a intervenção directa no conflito e a sorte da guerra começou a mudar. Em Julho de 1942 os japoneses sofreram as suas primeiras grandes derrotas navais e Rommel foi obrigado a bater em retirada em El-Alamein, em Novembro. O avanço alemão sobre a URSS foi travado em Estalinegrado e a contra-ofensiva soviética, obrigou as tropas de Hitler a recuarem até à capitulação em Fevereiro de 1943.

 

 A ambiguidade da neutralidade declarada pelo governo de Salazar, procurando manter relações com ambos os lados do conflito mas ostentando a sua evidente simpatia pelos regimes nazi-fascistas, suscitou o desagrado dos aliados que, no início de 1942, impuseram um bloqueio económico a Portugal.

Nestas condições, a situação agravou-se pois determinados bens, que já eram insuficientes, tornaram-se ainda mais escassos. Os jornais da época, embora de forma muito contida pela acção da Censura, deixavam transparecer as grandes dificuldades que foram impostas às populações.

Apesar destas dificuldades, o ano de 1942 não foi completamente desfavorável para Campo Maior pois, como ano cerealífero, foi considerado muito bom devido às colheitas de trigo, cevada, favas e grão-de-bico, produtos essenciais da agricultura alentejana. Chegou-se mesmo a pensar na realização das Festas. Mas, outras carências tornaram impossível tal intento. Havia também o problema da carência dos combustíveis, da falta de pneus e peças para arranjos dos automóveis e autocarros, o que levou a que os transportes públicos tivessem grandes dificuldades para se manterem em actividade. Isso constituía ainda mais outro impedimento para o normal abastecimento das populações.

 

Jornal de Elvas, Nº 730, 26 de Julho de 1942


FESTAS DO POVO


   Segundo consta, não se realizam este ano as festas do povo, devido à grande falta de papel, madeiras, pregaria e muitos artigos que são necessários para a ornamentação das ruas e, muito principalmente, a falta de transporte e ao melindroso estado da guerra mundial.

 

Jornal de Elvas, Nº 745, 8 de Novembro de 1942


GÉNEROS RACIONADOS


Dos géneros racionados, apenas tem sido fornecido o açúcar. Os restantes, desde o princípio do mês de Outubro findo, que não são distribuídos. Não há sabão, artigo tão necessário como qualquer dos géneros alimentícios. Segundo consta, a autoridade administrativa tem telefonado e telegrafado para todas as entidades que subentendem com a distribuição dos contingentes dos vários artigos, pedindo urgência no seu envio, pois prevêem qualquer mal-estar na população, por falta de higiene tanto pessoal como nos seus lares. Alguns dos habitantes, por falta de sabão, têm comprado sabonetes para lavagem das suas roupas, mas também estes já escasseiam no comércio. Por isso se pedem providências muito urgentes neste sentido.


 

 

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publicado às 19:12


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXVIII

por Francisco Galego, em 23.05.11

OS ANOS 40 (II)

 

As Festas de 1941, em si, parecem não ter tido grande brilho, pois não existiam as melhores condições para a sua realização. A data foi alterada de inicio para finais de Setembro, para corresponder ao melhor momento para fazer as inaugurações, pretexto para trazer a Campo Maior altas figuras do governo e da hierarquia da Igreja.

Uma extensa reportagem do jornal O Século, descreve desenvolvidamente as sessões oficiais e os discursos nelas proferidos mas, das Festas, apresenta apenas uma fotografia com a entrada da Rua 13 de Dezembro, sem qualquer referência à ornamentação das ruas que parece em nada terem impressionado o jornalista que escreveu esta reportagem.

O programa das Festas, publicitado através de folhetos de cuidada apresentação, com várias gravuras e interessante arranjo gráfico, mostra que o modelo tradicional teve de ser adaptado aos objectivos que presidiram à organização dos festejos. Esses objectivos eram essencialmente propangandisticos: mostrar as realizações do Estado Novo através da acção de uma estrutura corporativa, a Casa do Povo. Esses objectivos estão bem claros na notícia que a seguir se transcreve.

 

Jornal de Elvas, Nº 688, 5 de Outubro de 1941

      AS FESTAS DO POVO EM CAMPO MAIOR


Constituíram uma enorme manifestação de alegria, civismo e progresso. O Subsecretário das Corporações, o Arcebispo de Évora, o Comandante Tenreiro e o Governador Civil de Portalegre, visitaram a vila em festa.

 

Notícias de Campo Maior


   Festas do povo – Na última 3ª feira, dia 30, terminaram as festas do povo desta vila, que foram muito concorridas por grande número de forasteiros, especialmente da cidade de Elvas.

   Das touradas à vara-larga, não agradaram as duas primeiras, devido ao gado não prestar para esse fim. A assistência ficou porém, bem impressionada com o último dia, por o gado, pertencente ao lavrador Sr. Francisco da Silva Rasquilho Corado, ter satisfeito plenamente os desejos do público.

   Porque os programas distribuídos com profusão eram claros na afirmativa de que se tratava de Festas do Povo, e, portanto, para o povo, este colaborou intensamente, com a sua peculiar alacridade, no cumprimento rigoroso do estabelecido, quer embandeirando as ruas, quer tomando parte em todos os números de recepção e solenidade. Cantava-se e dançava-se com alegria esfusiante, talvez na ânsia simpática de olvidar mágoas e reveses … E sem povo não há festas. Como não as há sem foguetes, sem música e sem vontade de brincar. E Campo Maior, a vila risonha e modernizada que mira com altivez lusíada o orgulhoso reino de Espanha, confirma tudo quanto fica dito, porque saiu toda para a rua, construindo túneis airosos de papéis franjados, alinhando renques e renques de vasos de flores ao rés das paredes, pregando garridos painéis na embocada de cada rua, inscrevendo uma quadra de sua inspiração na frente de cada tecto de papéis pintados, enfim, dando à vila que tão bem recebe e trata os forasteiros um verdadeiro aspecto festivo, sem uma nota forçada, sem um constrangimento, sem um vestígio sequer de andar naquilo para não desmanchar prazeres. Onde havia um baile, havia um despique, um desafio de palavras plenas de significado amoroso ou de velha e remordente dor de cotovelo, pondo nas vozes batidas aquele estilo alentejano típico. Os ranchos não se rendem. Até alta madrugada, passam e tornam a passar, fazendo alarde da sua resistência física e da sua vocação para cantar. E, nem um conflito, nenhuma desordem, nem uma falta de respeito pelo forasteiro ou pela autoridade, Pelo contrário, cada rua era uma gentil sala de visitas com uma pequena mesa coberta de chávenas, bule, etc., tradição ingénua desta desafogada vila dada a tradições e costumes que são a melhor fonte do nosso folclore (…)

 Esta apagada reportagem (pretende) registar os factos mais importantes apontados pelo programa dos festejos promovidos pelo Grupo Desportivo da Casa do Povo, por ocasião da bênção e inauguração do Cruzeiro da Independência, Quartel da Legião, Lactário-Creche e Campo de Jogos e em benefício da Santa Casa da Misericórdia e da reforma dos trabalhadores sócios efectivos da referida Casa do Povo. Outros números faziam ainda parte da lista de atractivos, como um importante desafio de futebol entre o onze de honra da F.N.I.M. de Lisboa, que no seu elenco incluía o jogador do Benfica, Pires e a equipa representativa da Casa do Povo; uma gincana de automóveis, touradas à vara larga, arraiais, concertos musicais, fogos de artifício, iluminações, corridas de bicicletas, recepções oficiais, procissão, concursos de Jazz’s etc.

    (…) Um pouco antes das 11 horas, chegou o Sr. Arcebispo de Évora, D. Manuel da Conceição Santos que, em seguida e após ter rezado a anunciada missa campal, em pleno baluarte, lançou a bênção do Cruzeiro da Independência. Pouco depois, chegava a Campo Maior o Sr. Dr. Trigo de Negreiros , ilustre subsecretário da Estado das Corporações (…) Foi recebido na Casa do Povo que oficialmente inaugurou (…) Ainda antes do almoço, foi também inaugurado e benzido o quartel da Legião Portuguesa.

   … De tarde, foi dada a bênção do campo de jogos pelo Sr. Arcebispo de Évora realizando-se em seguida o esperado desafio de futebol (…)

O modesto estádio registou a maior enchente de que há memória.

   Concurso de Jazz’s – Às 22 horas de 2ª feira, dia 29, teve lugar, no edifício da Câmara Municipal, o concurso de Jazz’s. (Eram) todos de Portalegre, em que tomaram parte com muito brilhantismo, “ Os Lisos”, “Ideal” e “Ferrugem”. O prémio, uma linda e artística taça, foi conferido entre aplausos do público, ao último daqueles agrupamentos musicais.

   Festas do PovoGincana de automóveis – Na 3ª feira dia 30, no estádio Capitão César Correia, pelas 14 horas (…)

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publicado às 18:55


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXVII

por Francisco Galego, em 19.05.11

OS ANOS 40 (I)

 

Em Junho de 1940, no âmbito das comemorações do centenário, é inaugurada na Praça do Império, em Lisboa, a Exposição do Mundo Português, concebida como uma exaltação simultânea dos grandes feitos da pátria e da integração dos territórios ultramarinos no conjunto da nacionalidade. Apesar de alguns focos de descontentamento, quer do sector laboral, quer entre os estudantes e os intelectuais, os anos seguintes decorreram com alguma tranquilidade. O regime tinha criado as estruturas necessárias para assegurar a sua defesa e manutenção.

            Embora os governos, português e espanhol, tenham assumido conjuntamente o compromisso de evitar o envolvimento directo no conflito mundial, os anos quarenta foram anos de grandes dificuldades, devido aos efeitos provocados pela guerra. As dificuldades de abastecimento de produtos essenciais para as populações, provocou grandes restrições no consumo. Era enorme a falta de bens essenciais, tendo de se recorrer ao racionamento para assegurar o abastecimento mínimo das populações. A escassez produzia o aumento exagerado dos preços e, face à política de contenção salarial, as condições de vida não paravam de se agravar.

            No Alentejo em geral e, particularmente em Campo Maior, a situação das classes trabalhadoras atingiu dimensões de grande miséria, devido aos baixos salários dos trabalhadores agrícolas e ao carácter sazonal dos trabalhos no campo, que colocavam no desemprego grande parte da população, durante uma grande parte do ano. A situação era persistente e difícil, pois atingia foros de catástrofe sempre que uma seca mais prolongada, ou que chuvas mais abundantes, impediam as tarefas agrícolas ou destruíam as sementeiras, comprometendo as colheitas.

            Nestas condições, difícil seria esperar que houvesse tendência para festas ou diversões. Todas as capacidades e energias se concentravam no esforço para assegurar, até ao limite da resistência, as condições mínimas para sobreviver. Nesta conjuntura, as festas realizaram-se apenas duas vezes na década de quarenta: em 1941 e 1944. Mas, tanto num ano como no outro, isso só aconteceu devido à intervenção de um organismo corporativo – A Casa do Povo de Campo Maior.

 

Jornal de Elvas, Nº 681, 10 de Agosto de 1941

 

FALTA DE GÉNEROS

   Mais uma vez se chama a atenção para quem competir, para que sejam dadas as devidas providências no sentido de que, aos comerciantes de géneros alimentícios, lhes sejam fornecidos, pelos respectivos Grémios e armazenistas, quaisquer quantidades de géneros, para poderem vender a retalho aos seus fregueses. Os géneros que mais faltam no mercado são: açúcar, arroz, bacalhau, sabão, toucinho, banha de porco e manteiga de vaca.


FESTAS DO POVO

   Acabamos de saber que as Festas do Povo, que este ano são patrocinadas pela Casa do Povo desta vila, têm o seu início no dia 28 de Setembro, data em que vai ser inaugurado o cruzeiro da independência de Portugal, que está colocado no histórico castelo desta localidade.

 

 

Jornal de Elvas, Nº 687, 28 de Setembro de 1941

   Começaram ontem as Festas do Povo, promovidas pelo Grupo Desportivo da Casa do Povo, por ocasião da bênção e inauguração do Cruzeiro da Independência de Portugal.

   A fim de inaugurarem o Cruzeiro, Casa do Povo, Quartel da Legião Portuguesa e o estádio Capitão César Correia, estão nesta vila os Exmos. Srs.

Arcebispo de Évora, Sub-Secretário das Corporações, e General Comandante da Legião Portuguesa.

   As ruas estão ornamentadas com muitas verduras, bandeiras, flores naturais e artificiais.

 

Aqui está claramente denunciado o objectivo político que levou a esta realização. Além da inauguração do Cruzeiro, guardou-se também para esta data a inauguração da nova sede da Casa do Povo. Outras inaugurações importantes preparadas para o mesmo dia foram a sede local da Legião Portuguesa que ficou contígua ao quartel da Guarda Fiscal, o Lactário-Creche Santa Beatriz, na Casa do Povo e o campo de futebol construído no sítio onde antes tinha existido o demolido Forte das Pesetas ou da Traição.

 

Jornal de Elvas, Nº 687, 28 de Setembro de 1941


   Começaram ontem as Festas do Povo, promovidas pelo Grupo Desportivo da Casa do Povo, por ocasião da bênção e inauguração do Cruzeiro da Independência de Portugal.

   A fim de inaugurarem o Cruzeiro, Casa do Povo, Quartel da Legião Portuguesa e o estádio Capitão César Correia, estão nesta vila os Exmos. Srs.

Arcebispo de Évora, Sub-Secretário das Corporações, e General Comandante da Legião Portuguesa.

   As ruas estão ornamentadas com muitas verduras, bandeiras, flores naturais e artificiais.

 

Aqui está claramente denunciado o objectivo político que levou a esta realização. Além da inauguração do Cruzeiro, guardou-se também para esta data a inauguração da nova sede da Casa do Povo, que antes já tinha estado numa casa da Mouraria de Baixo, logo na porta acima da entrada principal da sede actual. Depois mudara para o prédio fronteiro à Igreja de São João, seguidamente estivera programada a sua mudança para os Cantos de Baixo,no prédio que faz esquina com a rua da Misericórdia, nos altos do desaparecido comércio do senhor José Pina, vindo finalmente a ocupar o Palácio Camarido, onde hoje ainda se encontra.

Outras inaugurações importantes preparadas para o mesmo dia foram a sede local da Legião Portuguesa contíguo ao quartel da Guarda Fiscal para o lado de Santa Cruz, no local das actuais Juntas de Freguesia, o Lactário-Creche Santa Beatriz, na Casa do Povo e o campo de futebol construído no sítio onde antes tinha existido o demolido Forte de S. João a que o povo chamava das Pesetas ou da Traição.


 

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publicado às 17:34


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXVI

por Francisco Galego, em 15.05.11

AS FESTAS EM TEMPOS DE GUERRA III

 

Em 1 de Abril de 1939, com a tomada de Madrid pelas tropas nacionalistas de Franco, estava ditado o fim da Guerra Civil em Espanha.

Em 1 de Maio de 1939, com a rendição incondicional dos seus aversários, o general Francisco Franco pôde anunciar a vitória total das suas tropas. A Espanha era uma sequência de devastados campos de batalha.

No começo de Setembro de 1939 começou a Segunda Grande Guerra com a invasão relâmpago da Polóni e consequente declaração de guerra da Inglaterra e da França à Alemanha.

Em Maio de 1940, o exército alemão invadiu a Bélgica, donde passou à França que conquistou rápida e facilmente. Em Junho, os alemães entram vitoriosos em Paris. A Inglaterra fica isolada na sua insularidade e só face aos ataques de Hitler. Começou então a Batalha de Inglaterra, uma batalha aérea que consistia essencialmente no bombardeamento das cidades. Em 7 de Dezembro de 1941, os japoneses, com o seu ataque surpresa a Pearl Harbour, arrastaram os Estados Unidos da América para a guerra que se extendeu ao Extremo Oriente e que se iria prolongar até à capitulação do Japão no início de Setembro de 1945.

 

Salazar declarou-se neutral face ao conflito. A nível interno a situação estava aparentemente pacificada. O regime entrava numa face de rigorosa vigilância e repressiva acção policial, enquanto a omnipresente Comissão de censura controlava fortemente a informação, colocando a maioria dos portugueses numa espécie de nimbo que os deixava isolados do resto do mundo. O regime cuidava de impor o modelo que Salazar fora gizando para Portugal. Começaram as grandes manifestações de apoio a Salazar que acelerou a consolidação do seu Estado Corporativo. Estas manifestações, mobilizando grandes massas com gente de todas as regiões do país que se deslocavam a Lisboa para manifestarem o seu público e massivo apoio a Salazar, instituíram-se como prática habitual, até ao fim do regime.

 

No que respeita às Festas do Fovo, as coisas não corriam de feição. Embora tenha sido publicado o "Programa" para a sua realização em Setembro de 1939, não há qualquer notícia nos jormais da região sobre a sua realização. Aliás, o próprio programa não faz qualquer menção à ornamentação das ruas, o que leva a supor que ela pode não ter sido realizada. Esta falta de informação sobre o que terá acontecido, agravou-se pelo facto de João Ruivo, até então a fonte mais certa sobre as Festas, ter sido promovido à segunda classe de tesoureiro da Fazenda Púbilica em 20 de Maio de 1939 e, em consequência, ter saído de Borba para Estremoz, deixando de dar notícias através dos jornais.

Só há muito pouco tempo, por gentil cedência da Srª D. Catarina (Tina) Murcela, tive conhecimento do programa destas Festas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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publicado às 15:09


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXV

por Francisco Galego, em 11.05.11

AS FESTAS EM TEMPOS DE GUERRA II

 

A Guerra Civil de Espanha aproximava-se do fim. Com o apoio declarado e algumas vezes directo da Alemanha nazi de Hitler e da estado fascista de Mussulino na Itália, era cada vez mais nítida a vantagem das forças comandados por Francisco Franco. A Espanha serviu de campo de ensaio para a "guerra total" que iria eclodir.

Em Portugal registava-se uma certa agitação social e política que Salazar utilizou para consolidar o seu  musculado Estado Novo corporativista.

O ano de 1938 começou com todas as polícias, forças militares e militarizadas em estado de alerta pela suspeição de que estivesse a ser organizado um golpe militar contra o Estado Novo. O regime ao mesmo tempo que toma medidas de prevenção, desencadeia um vasto plano de propaganda. Vão seguir-se várias comemorações de exaltação nacionalista que culminaram com a dupla celebração dos Centenários: o  da fundação de Portugal, em 1140 e da restauração da independência em 1940.

Neste contexto, as Festas do Povo procuraram ganhar um certo élan no ano de 1938, como se pode constatar pelo programa que foi anunciado. Mas os tempos não eram favoráveis a grandes festejos e, pelas notícias publicadas, podemos também constatar que o que foi efectivamente realizado ficou muito aquém do fora programado.

 

Brados do Alentejo, Estremoz, 28 de Agosto de 1938

Festas de Setembro


   As afamadas Festas de Setembro únicas neste género em todo o Alentejo e talvez mesmo em Portugal, realizam-se este ano em 4,5,6, 7e 8 do próximo mês. Este ano são promovidas pela Santa Casa da Misericórdia que prima em organizar um programa atraente. Há mais um dia de festa do que era costume, soberbas festas de igreja e procissões, fogos-de-artifício dos melhores pirotécnicos do país, touradas com gado bravíssimo e com várias surpresas, concertos musicais por excelentes bandas de música, feira franca, ornamentação geral de ruas, travessas, praças, Avenida e Bairro Operário, três valiosos prémios em dinheiro às ruas mais bem ornamentadas, grandes iluminações eléctricas e à veneziana, festival aeronáutico no campo do Rossio de S. Pedro, corridas de bicicletas e de automóveis, tiro aos pombos, etc., etc. As bandas de música que abrilhantam as festas são as de Palmela, Castelo de Vide, Alegrete e Academia dos Amadores de Música Campomaiorenses. As quermesses e tômbolas na Avenida Dr. Agrela, já há cerca de dois meses que funcionam dirigidas por gentis meninas que têm colhido boa receita.

   De ano para ano, estas festas vão melhorando graças ao amor pela terra que nos foi berço, principalmente pelas classes ricas que são as que mais auxiliam porque são as que mais podem. Há três meses que as comissões das ruas trabalham afanosamente nos preparativos para as ornamentações. Boa oportunidade para visitar Campo Maior, onde em geral todos os forasteiros ficam encantados com as lindas ornamentações de cunho regionalista, apresentando as ruas um completo jardim de mistura com as mais variegadas cores, não faltando os repuxos e cascatas onde as águas cantam, de dia e de noite, sobre renques de verdura.

Estas festas são também conhecidas pelo povo por festas do padroeiro, visto serem feitas em honra e louvor de S. João Baptista, padroeiro de Campo Maior. Junto à feira e ao jardim, há grandes campos para os forasteiros porem os carros e os gados, para comerem e pernoitarem, havendo no recinto abundância de água potável. As pensões e hotéis estão-se preparando o melhor que podem para receber os forasteiros.

 

O Correio Elvense, Nº 407, 4 de Setembro de 1938

   Nesta formosa e progressiva vila começam hoje e prolongam-se até ao próximo dia 7 as tradicionais Festas do Povo. Que há anos ali se realizam com grande êxito e muita concorrência, espacialmente desta cidade. O programa de tão atraentes festas é o seguinte:

Dia 4 – Às 6 horas, início das festas. Repique dos sinos em todas as freguesias e uma salva de 21 morteiros; às 12 horas, solene festividade religiosa na igreja de S. João Baptista, na qual tomará parte uma especial orquestra sob regência do maestro Lino Fernandes; às 15 horas, abertura da exposição de quadros e outros trabalhos do pintor Francisco Xara; às 18 horas procissão coma imagem do padroeiro S. João Baptista, a qual percorrerá as principais ruas da vila; às 21 horas, arraial na Praça da República, abrilhantado pela Banda da Academia dos Amadores de Música Campomaiorense, fazendo a sua apresentação de cantadeiras Rancho do Sor.

Dia 5 – Às 8 horas alvorada pela Banda da Academia dos Amadores de Música Campomaiorense; às 15 horas início da venda da flor por um grupo de gentis senhoras desta localidade; às 17 horas, grandiosa corrida de touros à vara larga, uma das mais características diversões do Alentejo, abrilhantada pela Banda da Academia; às 21 horas, apresentação na Avenida Dr. Agrela do rancho infantil, o qual apresentará várias danças e cânticos do seu vasto reportório; às 22 horas, continuação do festival nocturno, fogo preso e do ar, bailes e descantes populares.

Dia 6 – Às 16 horas gincana de burros e corrida de sacos, na Praça da República; às 18 horas, corrida de touros à vara larga abrilhantada pela Banda da Academia; às 22 horas, continuação do festival com fogo preso e do ar; às 0 horas, largada de um balão.

Dia 7 – Às 8 horas, alvorada pela banda, às 17 horas, última corrida de touros; às 22 horas, leilão de prendas não sorteadas na tômbola, concerto pela banda, bailes e descantes populares, fogo-de-artifício, preso e do ar.

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publicado às 14:37


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXIV

por Francisco Galego, em 07.05.11

AS FESTAS EM TEMPOS DE GUERRA

 

A Guerra Civil de Espanha desenrolava -se com sanha e crueldade do outro lado da fronteira. Para Campo Maior, a guerra estava mesmo aqui ao lado e isso afectava muito a vida e as preocupações das pessoas.

Sobre as Festas dos dois anos seguintes, as notícias são muito escassas. Os elementos disponíveis são insuficientes para se fazer uma análise minimamente fundamentada. Registe-se apenas a certeza de que as festas se continuavam a realizar apesar de o clima geral no país e no mundo ser tão pouco tranquilizador. A luta política estava tão exacerbada que teve também os seus reflexos locais. A imprensa regional deu grande eco a um comício anti-comunista organizado pela Casa do Povo de Campo Maior em 11 de Outubro de 1936, que teve ressonância e em que participaram, através das suas casas do povo, representantes de várias terras desta região. Estiveram presentes várias entidades civis e militares a nível distrital e nacional, tendo mesmo estado presente um representante do governo e um grupo de “falangistas” espanhóis.

A nível interno a situação não estava completamente pacificada. A 18 de Janeiro de 1934, acontecera a primeira tentativa revolucionária para derrubar o regime, com acções desenvolvidas em centros operários, principalmente na Marinha Grande, Barreiro, Seixal e Silves. Em Setembro de 1935 tinha-se dado mais uma tentativa de derrube do regime por golpe militar apoiado por civis republicanos e até por militantes do nacional-sindicalismo liderados por Rolão Preto, um movimento de extrema-direita. Em consequência, muitos opositores foram presos, tendo sido criado o Campo do Tarrafal, que iria funcionar até à década de cinquenta e onde iriam morrer alguns dos opositores ao regime. Um ano depois, em 8 de Setembro de 1936, marinheiros da Armada, tentando desencadear uma revolução popular, ocuparam três barcos de guerra fundeados no Tejo, frente a Lisboa. Em 4 de Julho de 1937, Salazar escapou por pouco a um atentado à bomba organizado por anarquistas.

 

 Brados do Alentejo, Estremoz, 29 de Agosto de 1937

Festas de Setembro

Para estas importantes festas, que este ano se realizam em 5, 6, 7 e 8 de Setembro, já foram distribuídos os programas. As festas constarão de festas de igreja, procissão, arraiais, fogos-de-artifício, feira franca e de gados, touradas, ornamentações em diversas ruas, gincana automobilística, iluminações eléctricas e à veneziana, etc. Haverá três valiosos prémios para as três ruas melhor ornamentadas, estando já a trabalhar-se nesse sentido.

 

 Brados do Alentejo, Estremoz, 26 de Setembro de 1937

Festas de Setembro

   Conforme se esperava resultaram brilhantíssimas as Festas de Setembro. A parte religiosa foi um primor. As touradas esplêndidas, sobressaindo muito o cavaleiro José Corado, o “Coradinho” e a banda taurina “os formidáveis” . As ornamentações das ruas como ano nenhum. As três noites de fogo esplêndidas e os concertos musicais a mesma coisa. A nova feira magnifica, tendo os feirantes feito bom negócio. Os forasteiros, em diversos meios de transporte, contavam-se aos milhares.

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publicado às 14:29


O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS XXIII

por Francisco Galego, em 02.05.11

 

Ano de 1936 (3ª Parte)

 

Em 16 de Agosto de 1936, o Jornal de Elvas noticiava a tomada de Badajoz pelas tropas de Franco. A guerra estava próxima, mas as forças republicanas continuaram a sua resistência até à capitulação final no início de 1939. Outra questão que merece algum interesse é o facto de, nas notícias destes anos, nas referências às Festas, ser usada mais a designação de Festas de Setembro do que Festas do Povo. Por mero acaso, ou porque assim estaria mais de acordo com as tendências ideológicas dominantes na época? Dá a impressão de que o lápis da censura terá entrado em funções. De qualquer modo, a designação Festas do Povo continuava a ser utilizada.

Na verdade, a guerra que lavrava feroz entre os nossos vizinhos não impedia que, ao que parece, a Vila de Campo Maior, mostrasse uma certa prosperidade. Pois é… Todos sabemos que, por vezes, com o mal dos outros nos damos nós muito bem. E também sabemos que o contrabando constituiu uma actividade de economia paralela que, ainda que perseguida e clandestina, tinha grande peso nesta região.

         

  Brados do Alentejo, Estremoz, 26 de Julho de 1936

Nova Banda


   È grande o número de sócios que se estão a inscrever constantemente na Sociedade Filarmónica Campomaiorense em organização. No próximo mês de Setembro deve chegar a esta o maestro contratado, cujo possui um curso superior de Conservatório. A Comissão Organizadora e os seus auxiliares têm ultimamente trabalhado afanosamente na sua organização. Oxalá não desanimem pois que a arte musical é uma das mais bonitas.

 

Festas de Setembro

 

Acha-se já contratada para abrilhantar estes grandes festejos, a reputada banda de Palmela e vai ser contratada também a filarmónica local.

Diz-se que dos diversos números de que se compõem os festejos, alguns novos, constará também uma festa de aviação no campo do rossio de São Pedro. Na avenida Dr. Agrela vão começar a montagem da grande instalação eléctrica para a sua brilhante iluminação. Diz-se mais que, nos quatro dias de festa, haverá carreiras de automóveis e caminhetas de Elvas e de Castelo de Vide e vice-versa.


Feira


   Decorreu muito animada como se esperava a Feira de Agosto, tendo vindo muitos forasteiros de Elvas, Vila Boim, Barbacena, Degolados e Ouguela. As duas touradas estiveram também boas com a sua pega e cambalhotas muito interessantes.

   Duas tendeiras que interroguei sobre o negócio, disseram-me que tinha sido excelente e que contavam aqui voltar para a festa.

 

O Correio Elvense, Nº 309, 6 de Setembro de 1936


   A vizinha vila de Campo Maior veste as suas melhores galas para receber os forasteiros que ali acorrem por motivo das Festas do Povo, que hoje têm início, terminando no dia 9. O programa é atraente: solenidades religiosas na igreja, de São João Baptista, com orquestra regida pelo Sr. José Roxo Duarte Sequeira, antigo subchefe da banda de Caçadores 8, desta cidade, concertos pela Banda Humanitária de Palmela, sob a direcção do mesmo senhor, procissão, festivais nocturnos no Jardim Público, fogos de artifício, festa da flor, corridas de touros à vara larga, inauguração do dispensário anti-tuberculoso, desafio de foot-ball, bailes e descantes populares, etc.

 

Brados do Alentejo, Estremoz, 20 de Setembro de 1936

Festas de Setembro


            Decorreram brilhantíssimas, como se esperava, as festas de Setembro e com farta concorrência de forasteiros. As ornamentações das ruas estavam soberbas, bem assim, touradas, fogos de artifício, feira, etc.


 

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publicado às 19:23


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