Os especialistas da revista inglesa The Economist elaboram, de dois em dois anos, um relatório feito a nível mundial – o Democracy Index – sobre o estado da democracia em 167 países. Estes, mediante a classificação que obtêm, são divididos em diversas categorias: As chamadas democracias plenas, são os países classificados nos 30 primeiros lugares; a das democracias imperfeitas, países do 31º ao 80º lugar; os regimes híbridos, entre o 81º e o 116º; os regimes autoritários, do 117º ao 167º.
A classificação resulta da análise da situação do regime político de cada país, em função de um conjunto de parâmetros: “Democraticidade eleitoral” (o processo eleitoral é feito ou não pelo voto universal; há ou não suspeitas de fraudes; a população dispõe ou não de acesso e de esclarecimento sobre os programas políticos); “funcionamento do governo” (a transparência dos actos governativos e a maneira como se respeita e são postas em prática as decisões dos órgãos democraticamente constituídos); a “participação política” da população (essencialmente avaliada pelos índices de abstenção); a “cultura política” (avaliada pela participação da população em acções de cidadania); as “liberdades cívicas” (garantia dos direitos de expressão e de reunião).
No relatório referido ao ano de 2006, Portugal apareceu colocado em 19º lugar, passando agora, no referido a 2008, para o 25º, o que significa uma queda de seis posições na classificação geral. Esta queda dever-se-á ao elevado nível de abstenção no referendo sobre o aborto efectuado em Fevereiro de 2007, pois o parâmetro “participação política” passou de uma pontuação de 6.11 para 5.56, mantendo-se igual em todos os outros parâmetros.
À primeira vista, parece não haver motivos para alarme. Contudo, se passamos para uma análise ao nível da União Europeia (UE), o caso apresenta-se de modo diferente pois que aí Portugal aparece em 16º lugar no conjunto dos actuais 27 países que a integram. Porém, se considerarmos que atrás de nós apenas ficam os países do recente alargamento (Estónia, Letónia, Lituânia, Roménia, Bulgária, Hungria e Polónia), e que dos antigos elementos da UE apenas a Itália ficou atrás de Portugal, então o caso muda de figura. Ou seja, no conjunto dos países europeus mais desenvolvidos, Portugal pode ser considerado como sendo um dos piores, em termos de vivência democrática.
Poderíamos buscar consolo no facto de se ter verificado uma tendência geral para a regressão da qualidade da democracia, pois se constata que apenas a República Checa apresentou melhorias, sendo que oito países apresentaram índices iguais e todos os outros pioraram. Contudo, o mal dos outros nunca resolve os nossos próprios problemas. A verdade é que, mesmo sem olharmos para os resultados deste relatório, todos nós percebemos que há uma preocupante queda na qualidade da nossa vivência democrática que, além da crescente tendência para a abstenção, se torna também visível no desinteresse alargado pelas questões políticas, na indiferença e no fraco nível de participação. Porque essa diferença também acontece nos outros países, não se torna tão evidente a degradação em cada um dos países, quando se trata de os compararmos.
Significativamente, a SEDES, Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, anuncia para este ano um congresso sobre a qualidade da democracia. O problema deve ser considerado preocupante e, como acontece com todas as questões sociais de carácter global, só poderá ser analisado se considerarmos uma interacção complexa de factores. Entre estes, terão de ser considerados os ligados à qualidade e à eficácia da educação.
Neste campo convém que a análise não se cinja aos dados estatísticos, pois, se é fácil constatar um crescimento dos dados referentes aos escolarizados e aos que participaram em programas de formação ou de instrução, esses dados nada nos dizem sobre a eficácia real desse acréscimo.
Uma coisa é a concessão dos diplomas que certificam graus de escolarização. Outra questão são as efectivas competências, conhecimentos e capacidades adquiridas ou desenvolvidas pelos educandos ou formandos, com a frequência dos cursos ou acções de formação ou de treino que tenham frequentado.
Por todo o lado, desde a escolaridade formal às “Novas Oportunidades”, passando pelas acções de formação, se nota uma preocupante tendência para facilitismos que não auguram boas consequências para o nosso futuro. Numa perspectiva nitidamente facilitista o diploma deixa de ter uma função de certificação de saberes adquiridos para ser tornar apenas num documento que facilita o acesso a determinadas vantagens. E, francamente, não é disso que estamos necessitados na nossa sociedade.
Não tendo isto em atenção, arriscamo-nos a ter muitos diplomados sendo, contudo, muito poucos os que estarão funcionalmente dotados das capacidade de serem utilmente produtivos em benefício da sociedade.
Em termos políticos, a democracia plena só pode existir se os elementos da sociedade têm plena consciência da sua condição de cidadãos. Em consequência, quanto mais carecerem de educação e formação, menos aptos estarão e menos apetência terão para exercerem a sua cidadania.