Corria o ano de 2004. Eu pusera em marcha o projecto de me reinstalar em Campo Maior, pois aproximava-se o fim da minha vida profissional com a chegada do momento da aposentação. Por isso vinha a Campo Maior com bastante frequência e começava a preparar a minha reintegração na vida local.
Acabadas recentemente as obras do novo edifício, José Pedro Caldeirão, presidente da CURPI, convidou-me para visitar as novas instalações. Durante a visita mostrou-me uma estrutura esquisita, formada por três dependências abobadadas, que funcionavam como cave e armazém e se situavam abaixo do nível da rua. Aliás, essas abóbadas ultrapassavam a terreno do próprio edifício, pois se situavam concretamente debaixo do piso da rua que corre paralela à fachada. Perguntava-me ele se eu saberia dizer que construção seria aquela, pois que já vinha de tempos bastante recuados. Fiquei um bocado perplexo não descortinando explicação plausível que pudesse ser dada.
Por essa altura, trabalhava como arqueóloga em Campo Maior, a Dr.ª Ana Carvalho Dias com a qual costuma trocar impressões sobre factos históricos e vestígios arqueológicos da vila, a qual me deu conta das suas buscas para tentar determinar a localização da desaparecida Porta de São S. Pedro, acesso principal da vila até finais do século XIX.
Não consigo explicar como mas, um certo dia tive a intuição que me permitiu dar explicação às ditas abóbadas que servem de armazém à CURPI: aquilo era, nem mais nem menos do que o pontão que servia de acesso à demolida Porta de S. Pedro, ultrapassando o fosso, noutros tempos cheio de água, que rodeava por aquele lado a fortaleza, formando a denominada Lagoinha que comunicava com a Lagoa ou Alagoa, situada junto das muralhas, do lado do Ribeirinho.
Posteriores investigações permitiram confirmar esta hipótese de localização da porta e até encontrar, a sua representação. Esta que a seguir se reproduz, num desenho concebido, com muita propriedade e exactidão pela D. Umbelina da Mata que teve a amabilidade de, a meu pedido, o executar a partir duma gravura encontrada nos arquivos militares:

Na passada semana, encontrando-me eu nas Instalações da CURPI, onde funciona a Academia de Cultura e Aprendizagem – Universidade Sénior de Campo Maior, recebi a visita do Dr. José Carvalho, jovem arqueólogo que supervisiona as escavações para instalação das tubagens destinadas ao abastecimento de gás à vila, devido ao facto de esta decorrerem em zonas que podem ter relação com vestígios de valor patrimonial e histórico. Queria falar comigo para se esclarecer sobre o significado de certas estruturas que começavam a aparecer nas valas que estavam a ser abertas na rua adjacente ao edifício da CURPI. Essas escavações que foram conduzidas com todo o zelo e cuidado, permitiram confirmar a hipótese, anteriormente formulada, sobre a localização da demolida Porta de São Pedro. Lá estavam, exactamente no local previsto, os claros indícios dos alicerces da cortina que ladeava a porta e que unia o Baluarte do Príncipe ao Baluarte de São João, este também conhecido pela designação de Cavaleiro.
Assim, confirmada a localização espacial da Porta de S. Pedro, acrescento o seguinte extracto das actas da Câmara Municipal de Campo Maior, que permite fazer a localização temporal da sua demolição:
11 de Outubro de 1902
Ofício do capitão de engenharia, chefe da 4ª Secção em Elvas, rogando à Câmara se digne dizer-lhe quem a autorizou a se apear o arco das Portas de S. Pedro, a fim de poder responder a uma nota que recebeu da Inspecção de Engenharia.
…O presidente informou que já havia respondido a este ofício de harmonia com a decisão tomada pela Câmara, que depois de ter ouvido dois peritos, mandou apear aquele arco visto que estava a desabar e com o trânsito impedido o que era motivo de justa reclamação.

A Porta de S. Pedro ou da Carreira, localizava-se ao fundo desta rua, entre o edifício da Escola e casa que, do lado direito, faz esquina com a rua de acesso ao Cavaleiro.