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EFEITOS ESPERADOS DUMA CRISE GLOBAL

por Francisco Galego, em 23.10.08

 

Sob o título “Mais défice, menos receitas e o mesmo rigor”, o editorial do DN de Sexta-feira 10 de Outubro, explica que “o exercício orçamental em 2009 vai ser muito exigente por parte das administrações públicas”. Em linhas gerais isto deve-se ao facto de os cálculos efectuados para o orçamento de 2009 terem tomado como base uma evolução da economia portuguesa que foi defraudada pelos efeitos da crise financeira que anularam completamente todas previsões efectuadas no início do corrente ano.
Na actual conjuntura, as receitas públicas serão fortemente reduzidas em consequência da quebra das receitas fiscais, haverá um crescimento do défice, uma desaceleração do crescimento económico, uma tendência para o aumento do desemprego, uma maior pressão sobre a Segurança Social.
Assim conclui o referido editorial: “ Tudo o mais são fantasias. As restrições na criação de riqueza impõem-se sempre e exigem do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, bem como da Segurança Social, em 2009, ainda maior rigor na administração das verbas que os contribuintes lhes vão confiar. Ou seja, zero de bodos eleitoralistas”.
Que efeitos serão espectáveis a nível dos pequenos concelhos? Aí onde o tecido industrial é fraco ou quase inexistente, onde a produção agrícola se arrasta numa lenta e asfixiante agonia, qual será o futuro que espera as suas populações, já tão deprimidas e em processo tão acelerado de redução?
Há situações nas empresas locais de muitas destas povoações que tornam particularmente preocupantes os efeitos que a crise global lhes possa vir a causar. É sabido como alguns dos empresários, fixados nas pequenas terras do interior, tendem, por razões afectivas e filantrópicas, a deixar crescer os investimentos das suas empresas em capital humano, ou seja num alargado recrutamento de pessoal. Se alguns procuram simultaneamente promover também os investimentos no desenvolvimento tecnológico das suas unidades de produção, outros vão-se descuidando aproveitando a mão-de-obra abundante, ainda que pouca qualificada, que têm à sua disposição. Este processo tem ido disfarçando algumas das carências estruturais da economia portuguesa, mas tem sido em boa parte responsável pelo nosso atraso económico. Mas, se por efeito da crise houver uma forte retracção do consumo, como poderão as empresas manter os excessivos gastos que, apesar do nível baixo dos salários, investem em pessoal?
Vejamos também a situação das populações dos concelhos que têm o potencial de empregabilidade concentrado em uma ou duas grandes empresas, as quais, por efeito da crise terão de recorrer ao despedimento em massa. Se a solução for a dos despedimentos em grande número, aí teremos um grave efeito local da crise geral.
Sendo conhecida a deficiente capacidade de muitos dos autarcas das terras mais pequenas, mais isoladas e das zonas mais interiores, qual será o destino que espera as suas populações?
A situação pode vir a tornar-se muito preocupante tanto mais que esses autarcas, habituados ao bambúrrio dos gastos em desinvestimentos de carácter eminentemente eleitoralista, já começaram, há bastante tempo, a preparar-se para as eleições do próximo ano. Os mesmos que desde há muito vêm gastando sem critério e sem qualquer preocupação em desenvolver projectos que acautelem o futuro, em caso de crise.
Culpa de quem esta preocupante situação? Da pouca preparação das populações, presas fáceis de oportunismos e golpismos de todos os feitios e intenções? Da falta de formação, consciência social e cívica de muitos dos que ocupam cargos na administração local? Sim, de tudo isso. Mas, porque a acção fiscalizadora dos órgãos autárquicos não funciona em muitos casos, falta também uma acção coordenadora do Estado efectuando com frequência regular e eficaz, acções de fiscalização e avaliação da actuação do poder local. Há situações de escandalosa suspeição e de mais do que duvidosa legalidade que há muito deveriam estar a ser investigadas. As autarquias estão apinhadas de funcionários e sofrem de uma atroz incapacidade de decisão para elaborarem projectos e tomarem decisões; uma parte significativa dos seus orçamentos desaparece num voraz despesismo destinado a acções de discutível utilidade pública e de objectivos dificilmente consensualizáveis.
Em certas terras do “interior profundo”, como os políticos demagogos gostam de dizer, se já é preocupante estarmos na eminência de uma crise de que ainda não conhecemos com o necessário rigor as causas, as dimensões e os efeitos que poderá vir a provocar, torna-se angustiante a certeza de que estamos terrivelmente mal preparados e capacitados para a enfrentar e procurar soluções para a minorar. Não sabemos como, não temos com quem, nem confiamos naqueles que nos deviam liderar. Perante uma situação tão complexa torna-se tragicamente evidente como foram errados os caminhos por onde se foram perdendo as oportunidades falhadas do nosso poder local.
Admito e desejo que venham a ser encontradas soluções que evitem o rebentamento desta crise financeira global de efeitos previsivelmente tão catastróficos. É tempo de despertar para a verdade evidente de que a política é assunto demasiado sério, que exige muita preparação de quem se disponibiliza para assumir as responsabilidades inerentes ao exercício dos cargos que ela implica.
 

 

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publicado às 18:47


VELHOS RUMOS, NOVOS RUMOS

por Francisco Galego, em 10.10.08

 

Ao longo dos trinta e seis anos em que assumi perante mim a missão de me tornar um educador, evitei a todo o custo dispersar o meu tempo, esforço e energias em qualquer outra actividade que me desviasse do rumo que tinha traçado para a minha vida. Só o imperioso dever cívico imposto pelas circunstâncias me fez abrir esporádicas excepções.

Recebi com grande entusiasmo a democracia que veio coroar uma expectativa, por vezes desesperada, de longos e sofridos anos. Logo que entendi que o processo estava consolidado voltei-me de novo para a exclusividade da minha missão.

Agora que essa minha missão chegou ao fim, passei a ter mais tempo e maior disponibilidade para observar e pensar os processos sociais que se iam desenvolvendo à minha volta.

O meu sentimento tem-se inclinado cada vez mais para a percepção de que estamos a viver tempos difíceis, tão difíceis e complexos quanto parece certo que não estão a ser usadas as soluções mais adequadas para os resolver.

Mário Soares, num brilhante artigo publicado no Diário de Notícias no passado 23 de Setembro, chama a atenção para este momento crítico que intitula de “Crise Sistémica” e fá-lo com a propriedade e clareza de ideias que lhe conferem a provecta idade, a sapiência que lhe advém da longa e profícua experiência da vida, dos homens e da sociedade.

De um outro quadrante do espectro político, Maria José Nogueira Pinto, no artigo “País Experimental”, D.N. de 25 de Setembro passado, aborda também a questão desta conjuntura de crise que atravessamos: “Experimentámos todos os estilos e graus de demagogia no exercício da política e o esvaziamento da representatividade e da participação; experimentámos uma cultura aparelhística, a subversão do interesse público e a indiferença crescente dos cidadãos…

É este país que vai, em breve, a votos. Já se ouve a voz dos faltosos pagadores de promessas, disfarçados em vendedores de sonhos, a apregoar a mudança.”

Bem… Se tudo isto é pressentido com esta gravidade a nível do país, ressoa com muito maior clamor quando passamos para o nível do poder local, porque aqui os maus agentes políticos ainda são mais impreparados, o que torna muito mais graves as consequências da sua acção, com efeitos directos sobre as populações.

A este nível, a impreparação dos improvisados políticos e as suas fragilidades culturais, geram um modo de fazer política que podemos apropriadamente designar por populismo anti-elitista porque, para melhor chegar ao apoio das camadas menos preparadas da população, se arvoram em paladinos defensores dos pobres e declarados inimigos das elites, enquanto tudo fazem para garantirem para si e para os seus todos os benefícios dessas elites que tanto apregoam repudiar.

Que fazer perante a trágica situação de termos uma população tão impreparada, tão facilmente manipulável por estes inescrupulosos oportunistas?

Persistir na denúncia constante destas situações, lutar pelo aprofundamento de uma cultura democrática e de uma maior participação cívica dos cidadãos, prosseguir no esforço de dar um novo alento à sociedade fazendo emergir novos líderes capazes de elaborar e pôr em execução projectos que garantam novas soluções políticas que melhorem as condições de vida das populações.

Temos de voltar aos valores éticos que tornem de novo a política uma arte e uma ciência ao serviço do Homem e não a habilidade astuta dos que só pensam em beneficiar-se mediante negociatas escusas, tráficos de influências e práticas de corrupção. Os homens de verdade e de boa vontade devem juntar esforços para pôr fim a estas situações abusivas que estão a tornar cada vez mais insuportável esta nossa forma de viver.

Necessitamos de políticas direccionadas para o desenvolvimento económico, para a garantia da segurança e da estabilidade social, através de maiores e melhores oportunidades para as novas gerações, pois nelas assenta a possibilidade de sustentação das gerações mais idosas que deixam de estar em condições de participarem na produção, para que possam viver de reformas que lhes garantam uma aceitável qualidade de vida na sua velhice. Só com políticos sérios, honestos e competentes, homens e mulheres de sólido carácter, poderemos ter soluções adequadas para os problemas que hoje se deparam às comunidades locais.

Precisamos de começar a suspeitar dos que prometem grandes facilidades, vantagens e constantes diversões. Os tempos que aí vêm são tempos difíceis. Prestem atenção aos que avisam dos perigos que teremos de enfrentar. O nosso sistema social está em crise e as crises só podem ser vencidas com o esforço e os sacrifícios de todos. Atenções aos vendedores de promessas que nunca pagam, porque nunca tiveram a intenção de as pagar as promessas que fizeram.

Os malabaristas da política e os cúmplices que os rodeiam e apoiam, cuidam apenas de assegurar os seus próprios interesses, confundindo o serviço público com os seus negócios privados. Descuidam o desenvolvimento das questões essenciais: emprego, salários, saúde, educação. Gastam os orçamentos dos organismos que governam em obras de fachada e em festanças, enquanto enriquecem escandalosamente à custa do povo.

Não que seja vergonha ser detentor de bens e de riqueza. Todos nós conhecemos pessoas que, ainda que bastante ricos, mostram preocupação com os problemas sociais, empenham-se em resolver os problemas dos mais desfavorecidos, contribuem para o bem-estar dos seus concidadãos. Vergonhosa é a maneira como, através do engano e da corrupção, alguns conseguem beneficiar-se escandalosamente. É contra estes que temos de estar atentos para tentarmos travar a sua nefasta acção.

 

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publicado às 18:24


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