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AINDA SOBRE OUGUELA

por Francisco Galego, em 18.01.15

 

NA APRESENTAÇÃO DO LIVRO – “A ANTIGA VILA DE OUGUELA”

(16 DE JANEIRO DE 2015)

O livro que aqui apresento tem o título de “A Antiga Vila de Ouguela – Elementos para a sua História”. Trata-se de uma monografia, na qual procurei reunir as informações disponíveis que me pareceram importantes e úteis para revelar o passado desta povoação que, sendo de facto bastante pequena, é contudo muito importante para entendermos o passado do concelho de Campo Maior.

De certo modo, a razão que me levou a elaborar este pequeno livro, foi determinada pela minha vontade de contribuir para dar sentido à decisão de se levar a efeito a restauração de um edifício que tanto poderá contribuir para a valorização deste nosso concelho – a chamada Casa do Governador.  

Sendo evidente que não disponho nem do poder político para decidir, nem de poder económico para tornar efectivas as decisões, tinha de recorrer ao único poder que a vida que eu escolhi, me propiciou: a capacidade de recolher informações, de lhes dar sentido e de dar a conhecer aos outros os sentidos que nelas vou descobrindo.

Faço-o na esperança de que os que podem decidir e os que podem viabilizar essas decisões, queiram aproveitar da melhor maneira este meu modesto contributo. Por isso, aqui venho apresentar-vos este livrinho que é um testemunho construído com a finalidade de que, enquanto objecto cultural, possa servir de apoio a outras finalidades.

Falando do que é cultural, convém colocar duas perguntas a que vou tentar responder dizendo o que penso sobre esta questão:

- Mas, afinal, o que é a cultura?

- Será que devemos prestar uma atenção cada vez maior às questões culturais?

Alguns resolvem a questão com uma frase – que, no meu entender, levanta muitas objecções – dizendo: “Tudo é cultura!”.

E, com isso dão-se por satisfeitos, sem perceberem que assim, incluem no conceito de cultura tudo o que não se pode, nem se deve considerar como tal. Com base nesta presunção, muitos dos eventos que se apresentam como sendo culturais, não passam de entretenimentos que implicam elevados gastos, garantindo pouco ou nenhum retorno em termos de cultura porque, entretêm, implicando elevados recursos, sem garantirem Instrução, Formação e Educação aos que neles participam. Ora, o meu conceito de cultura implica, os três aspectos estruturantes da personalidade humana – INSTRUÇÃO, FORMAÇÃO e EDUCAÇÃO – porque, pela Instrução tornamo-nos mais sabedores, pela Formação tornamo-nos mais competentes e pela Educação aferimos os nossos comportamentos, modelando aquilo que designamos como o nosso carácter.

A cultura pode e deve ser definida como aquilo que resiste ao tempo, perdurando como memória. E isto, nada tem a ver com o facto de as acções terem um carácter mais erudito, ou um carácter mais popular. Porque, tal como certas manifestações que se apresentam como muito eruditas podem ser muito pobres nos seus efeitos culturais, há manifestações de carácter acentuadamente popular que se transformam em cultura e património porque não são apenas efémero entretenimento. Como ilustração do que afirmo, veja-se o caso das “Saias” e das “Festas do Povo”, duas manifestações da cultura popular da nossa terra e que constituem elementos valiosíssimos do nosso património cultural. Assim é, porque a cultura, sobretudo na sua feição histórica, favorece o desenvolvimento e testemunha a evolução. Por isso, só ela nos dota da capacidade de compreendermos as razões das coisas que vão acontecendo e nos torna aptos para melhor atingirmos os objectivos que nos propomos alcançar.

Um povo que não conhece o seu passado e que só cuida de remediar o seu presente, não está a garantir o seu futuro.

Acontece que, ao contrário do que alguns pensam, vivemos numa sociedade que tende a valorizar cada vez mais os produtos com valor cultural porque, é a mais-valia cultural de certas coisas que motiva as pessoas a deslocarem-se, pelo interesse que têm em conhecê-las. Daí que a cultura seja um dos principais factores de incremento do turismo. E o turismo é uma actividade que tende a alcançar um interesse económico cada vez mais significativo nas futuras sociedades humanas. Por isso, devemos entender a preservação e a consolidação do património como uma das bases da sustentabilidade e do desenvolvimento da economia.

Qualquer decisor político, bem informado tem isto como evidente.

Dito isto, vamos então à razão que aqui nos juntou: Apresentar este livrinho que se propõe informar sobre o passado de Ouguela, começando por explicar a perspectiva e os objectivos que orientaram a sua elaboração.

Entre os obreiros do conhecimento da História, há uma grande diversidade de perspectivas, de atitudes e de objectivos. Logo, é natural, é útil e é apropriado, definirmos aquela em que nos colocamos. Porque, quando não há uma definição e uma ideia concreta da maneira como nos colocamos perante o saber histórico, podemos, não conseguir resultados seguros e aceitáveis e, assim, não contribuímos de forma útil para o seu conhecimento.

Por isso, se o conhecimento histórico vai sendo revelado pelos que se empenham na descoberta dos testemunhos do passado, para que se possam elaborar as explicações a partir das quais podemos ir tecendo um conhecimento fundamentado que mostre os aspectos, as fases e os episódios duma evolução, ele vai sendo revelado pelos que assumem a função de, a partir da aquisição desse conhecimento, divulgarem e fazerem entender esse ramo do saber a que chamamos a História.

Por outro lado, sendo evidente que, no estudo da História nunca se consegue ser exaustivo, então devemos procurar progredir e tentar alcançar o máximo possível de perfeição. Por isso, entendo que, no conhecimento da História, devemos procurar ter em consideração, três linhas fundamentais de orientação:

- A perspicácia na formulação de hipóteses de explicação;

- O rigor na procura e na verificação da veracidade dos testemunhos e das provas

que vamos encontrando;

- A credibilidade e a clareza na apresentação e na explicação dos resultados

obtidos.

Porque tomo muito a sério esta questão, quero definir, da maneira mais clara e precisa que me for possível, como me situo perante o conhecimento da História.

Em primeiro lugar, fui durante a maior parte da minha vida, por inclinação, por gosto e por formação, um estudioso da História.

Depois – porque me tornei professor – entendi que teria de me esforçar por aprofundar continuamente os meus conhecimentos, para me tornar um facilitador da aquisição do saber da História àqueles que me cabia orientar, para os dotar das competências que lhes facilitassem a aquisição deste tipo de saber.

 

Pois bem: No fundo, este livro é apenas mais uma manifestação daquilo que escolhi fazer ao longo da minha vida: aprender História para facilitar aos outros, a aquisição deste conhecimento que considero tão importante para a compreensão da nossa própria vida. Com este livrinho pretendo facilitar o conhecimento do passado de uma pequena vila que, ainda que tenha sido sempre de pequena dimensão, desempenhou, ao longo dos séculos, uma função importante na defesa do país a que pertencemos. Se compreendermos lucidamente este seu passado de verdadeira sentinela da fronteira, estaremos mais aptos a compreender a importância de a preservarmos no presente, garantirmos o seu futuro e de não a condenarmos à degradação e ao esquecimento.

Pensar que o desaparecimento será o futuro inevitável da pequena vila de Ouguela, revela apenas ignorância e incompetência dos que deviam ter como função encontrar as soluções mais adequadas. Porque, quem não sabe preservar e valorizar o património deixado pelas gerações passadas, prova não estar apto para gerir agora o património que é preciso valorizar e conservar para as gerações futuras.

No fundo é disso que estamos a cuidar, nós os que, aqui e agora, estamos reunidos para, com este livro, celebrar a preservação do património e da memória histórica de Ouguela. É errado considerar que os actos de preservação do património devem ser tomados como acções abusivas de gasto dos nossos recursos. Porque, se bem projectados e executados segundo objectivos bem definidos, eles são investimentos ponderados e seguros para que se possam encontrar formas de garantir o futuro das povoações, mesmo das que, sendo pequenas, encerram elementos históricos muito antigos e significativos.

Para melhor entendermos esta questão, talvez convenha tentarmos compreender algumas das razões que, noutros tempos, levaram ao abandono de tantos elementos importantes do nosso património.

No caso de Ouguela e de Campo Maior, uma vez perdida a sua função defensiva em meados do século XIX, as fortificações tornaram-se elementos inúteis e sem valor para as autoridades locais.

Uma certa concepção dominante na ideologia liberalista que se foi impondo ao longo do século XIX e que se projectou na primeira metade do século XX, levou à convicção de que havia que abandonar o passado – considerado ultrapassado e aberrante – para que pudesse emergir o luminoso progresso, considerado a base de todas a mudanças, de todas as esperanças e da resolução de todos os problemas. Por isso, os vestígios desse passado deviam ser ignorados ou mesmo eliminados para que não obstassem a que o progresso se fosse realizando.

Em Campo Maior, temos como exemplos desta convicção, a destruição das muralhas para rasgar novas ruas e avenidas, a destruição da Porta de São Pedro e a alienação por venda aos particulares de seis dos dez baluartes que faziam de Campo Maior uma das mais importantes praças de guerra para a defesa das nossas fronteiras.

Os antigos monumentos viram-se condenados ao desleixo, ao derrube, à ocupação, à alteração, à adulteração, à espoliação e à supressão de algumas das suas características ou partes essenciais.

Mas, mesmo nesse tempo, como acontece em todos os tempos e em todos os lugares, nem todos sofriam da mesma miopia política e cegueira cultural. Havia homens esclarecidos. Contudo, os homens com poder de decisão, não tinham a preocupação de os ouvirem, sendo que alguns, nem mesmo tinham inteligência e cultura suficiente para os entenderem.

João Dubraz, um grande escritor nosso conterrâneo, infelizmente ainda muito pouco conhecido, escrevia no ano de 1869, referindo-se ao abandono em que estava o castelo de Campo Maior, há cerca de 150 anos:

Que governos são os nossos, tão avessos aos monumentos das antigas eras, que vão achatando o país com as ruínas desses poéticos gigantes da Idade Média?

Senhores ministros (…) é uma vergonha que caia o formoso castelo de D. Dinis, por causa da miserável economia de algumas moedas. Quem não conserva os monumentos históricos, testemunhas quase vivas do heroísmo das gerações que nos precederam nesta terra, bem merece que, ampliando-se o dito pungente de Almeida Garrett, se diga: “Portugal é pequeno, porque os homens não são grandes.”

E acrescentava o notável escritor:

Quer saber o leitor o que são os nossos governos? São prodígios de proporção: Se a terra é pequena, os que a governam são… microscópicos.

Estamos agora noutra época, em que cada vez mais gente tende a adoptar outra atitude para com a herança do passado. O que era tido como incómodo e obstáculo para o progresso, tornou-se património a preservar e conservar, como parte desse progresso. Descobriu-se que o património cultural pode ser, se bem gerido, fonte de rendimentos necessários e úteis para as comunidades onde os monumentos se localizam. Estamos num tempo de conservar, preservar e rentabilizar tudo o que, tendo escapado à fúria do progressismo de outros tempos, tenha um verdadeiro valor cultural.

Os tempos são outros, outra é a mentalidade e outras devem ser as razões que orientam as decisões na nossa comunidade, se queremos e pretendemos estar em concordância com o que são as tendências, os conhecimentos e as exigências do nosso tempo.

Esta é maneira como eu, com toda a convicção, analiso e valorizo esta questão. Por isso, elaborei este modesto livro. Nele procurei reunir os documentos que me pareceram ser mais importantes e mais significativos para a compreensão da história da pequena Antiga Vila de Ouguela.

 

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