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Aqui se transcrevem textos, documentos e notícias que se referem à vida em Campo Maior ao longo dos tempos
ESTEVÃO DA GAMA DE MOURA E AZEVEDO, sendo nesse tempo o governador militar desta praça de guerra, narrou a tremenda catástrofe que testemunhou directamente. De forma muito significativa, este autor deu ao texto em que relata o efeito que nele provocou este terrivel acontecimento, o titulo de Destruição da vila de Campo Maior, no incêndio que teve. Este texto foi incluido na obra NOTÍCIAS DA ANTIBUIDADE E ESTADO DA VILA DE CAMPO MAIOR (...), com organização, introdução, biografia, transcrição e notas de Rui Rosado Vieira, publicada em 1993, em edição promovida pela Câmara Municipal de Campo Maior. (Pág.s 135 a 141).
Neste texto, o autor começa por nos informar da estrutura da torre, cujo rebentamento deu origem a este trágico acontecimento de que relata depois os efeitos mais dranáticos que provocou.
“Esta torre tinha uma cisterna no primeiro pavimento; no segundo, uma casa e, nas quatro paredes dela, quatro capelas, e no terceiro pavimento outra casa. A cisterna não recebia água havia muitos anos e na segunda casa estava a pólvora em barris. Para maior segurança, a porta de entrada estava tapada com pedra e cal.
O ano de 1712, em que foi sitiada esta Praça pelo exército castelhano e nós a governávamos, mostrou a experiência que era à prova de bomba, porque, caindo nela nove bombas de 16 arrobas cada uma (cerca de 80 kg), as expulsou fora sem lhe fazerem o menor dano. Por esta causa se fazia a maior confiança deste lugar para a segurança de tão preciosa coisa para a defesa das praças,
Achava-se nela a porção de 5.743 arrobas e 6 arrates (cerca de 86 toneladas de pólvora) e, na última casa, 4.800 granadas muitas delas reais (ou seja, para serem lançadas por peças de artilharia) , e outras de mão, que tudo rebentou ao mesmo tempo e estas foram as que fizeram maior dano no telhados, no Bairro de S. João e no Largo das Estalagens (actual Largo do Barata, popularmente chmado Largo do Assento).
Era a torre toda de pedraria grossa, assim por fora como por dentro e as abóbadas, das nove ruas que tinha, eram também de pedra de enchilaria (ou seja, de silharia = pedra aparelhada) sem que entrasse ali outro material.
Foi tal o impulso da pólvora, que arrancou a torre dos seus alicerces e a desfez em miúdos pedaços e juntamente todo o muro do Castelo que, sendo obra muito antiga, lhe não valeu a sua fortaleza, antes a muita fortaleza que tinha a torre foi a causa de maior estrago que padeceu este infeliz povo (…)
Com a trovoada, que algumas horas antes principiara medonha, estavam os moradores já despertos e implorando a clemência divina. Ao estrondo da pólvora e da torre, caíram 836 moradas de casas das 1.076 de que se compunha a povoação e as outras ficaram sem telhados e nenhuma sem ruína.
“Entre grandes e pequenas, morreram 256 pessoas e ficaram feridas mais de duas mil”.
Arruinou-se o coro e o frontispício da Igreja Matriz, algumas das suas abóbadas e colunas, quebraram-se todas as portas e algumas imagens.
Arruinou-se o Convento de S. Francisco. Não caiu a sua Igreja, mas o frontispício dela, algumas celas e a cerca, padeceram grande estrago.
Arruinou-se, em parte, o Convento de S. João de Deus e o Hospital, inteiramente, de sorte que os religiosos foram para a Rua da Canada… e os enfermos para a guarda de S. Francisco, donde ficaram se curando.
Arruinou-se o Hospital da Misericórdia (o antigo, situado na rua do mesmo nome), mas não a sua Igreja, só as portas e janelas se fizeram em pedaços
Arruinou-se a Igrejinha do castelo, mas a capelinha em que está o Senhor ficou sem lesão.
A milagrosa imagem de S. João Baptista que estava depositada numa Ermida do Governador Estêvão da Gama, não teve ruína nenhuma e, padecendo-a as próprias casas (do palácio) nada aconteceu às que estavam contíguas à Ermida. (…)
Deu-se conta a El-rei D. João V, Nosso Senhor, o qual mandou logo pela posta o seu cirurgião José Ricolth, com medicamentos e ordem para que se curassem todos os feridos. Mas, antes que este chegasse, tinha o Conde de Alva mandado quatro cargas de botica, para que se assistisse com ela a todos os feridos desta fatalidade.
O Cabido de Elvas mandou logo dois cónegos com 100 moedas de 4.800 (réis) cada uma, para socorrerem os necessitados… os quais erigiram um hospital nas casas da Mitra(casas do bispo de Elvas, na rua da Canada) para que nele se recolhessem todos os pobres necessitados, a quem assistem 6 religiosos capuchos do Convento de Elvas …
Mandou sua majestade 200 moedas de ouro para se repartirem pelos pobres… Os padres de S. Domingos de Elvas mandaram repartir pela pobreza 740 pães, 12 carneiros e uma carga de vinho. Os padres da Companhia da mesma cidade mandaram duas cargas de azeite e algum dinheiro…
Mandaram-se vir 75 soldados de Elvas e 75 de Olivença, para trabalharem no desentulho do Castelo.
Sua Majestade mandou 20 mil cruzados para limpeza das ruínas que embaraçavam as ruas e para se irem reedificando algumas casas dos pobres que, por falta delas, se tinham ausentado (algumas famílias foram para Albuquerque e para outras povoações vizinhas). Mandou-se fazer a avaliação de todas as casas arruinadas, por Diogo Pereira, empreiteiro que tinha sido das obras da fortificação… achou este que, pelo que tocava às casas dos moradores, importava em cento e vinte e oito mil cruzados; mas, entrando neste negócio más inteligências, foram-se as coisas pondo de tal modo, que não mandou Sua Majestade mais nenhuma ajuda de custo. E ficaram muitos moradores sem ela… os que se chamavam ricos ficaram sem ajuda nenhuma.
Mas El-Rei aliviou o Povo, por 10 anos, do tributo de 4 e meio por 100 e do cabeção. E mandou aplicar a terça do concelho para reedificação da Igreja Matriz e dar o acréscimo do depósito comum e 400 moios de trigo para se fazer uma Praça Nova, Casas da Câmara, Açougues e Cadeia, nos quintais que há entre a Rua da Canada e a do Manantio, com entradas para estas duas ruas e para a de S. Pedro, cuja obra se deve principiar.
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